24.3.09

A Orquestra

O som ainda não vinha, mas já estava no ar, estático, e já podia se sentir seu cheiro ecoando por todas as paredes e assumindo uma atmosfera magnificamente harmoniosa. Arcos mexeram e remexeram, na ansiedade do gesto que os deixariam livres para correrem em direção à suas amadas cordas. Dedos já acariciavam suas respectivas fibras e metais, na espera da queda da batuta. Caiu. Dedos que até então pareciam dormentes em suas teclas, espreguiçaram-se e emitiram os primeiros sons, curiosamente harmoniosos. Esticaram-se mais um pouco e alcançaram algumas teclas ao lado, como se brincassem por entre elas, até que um som estridente (mas caloroso) surgiu no ambiente, assustando-os e fazendo-os correr desenfreadamente por todas as direções, escalas e pautas. Pareciam, na verdade, entretidos com os peculiares pontos e linhas desenhados primordialmente em pedaços de papel à sua frente (mais por aqueles sem linhas, porque acompanhando-os por um momento, percebi que se demoravam mais quanto mais redonda e vazia a figura parecia). Ao mesmo tempo, tudo parecia frustrante, porque apenas uma pequena vara dançava ao som da música (em parte julguei ser um enorme desrespeito, mas percebi que também morria de vontade de me mexer), mas momentos depois vi que todos ali tocavam para que ela dançasse (ou o fato de que quando ela parava de dançar causava a pausa de toda a canção era uma impressionante coincidência). Foram os únicos momentos em que meu coração estava na ponta de cada um dos meus dedos, de forma que tive de cerrar os punhos para contê-lo e não o deixar escapar. Ah, o que seria dos Homens sem a música... A mais clara evidência de que os céus existem.

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